Uma palavra, que na primeira vista (ou escutada, nesse caso), soa bem dramática. Lembro-me como se fosse ontem a primeira vez que escutei esse termo. Era Setembro de 2018 e eu estava fazendo um curso de gerenciamento de projetos na Universidade de Berkeley. Tudo era novo pra mim, afinal de contas fazia pouco mais de um ano que eu havia mudado para a Califórnia. O idioma ainda estava em fase de entrada nas orelhas, os costumes básicos - tipo jantar às 5:30 da tarde antes da aula era um absurdo, as regras de trânsito então - nem se fala!
As minhas aulas eram no campus de San Francisco, então eu dirigia todas as terças e quintas pra City (como o pessoal que mora na ‘região metropolitana’ de San Francisco chama SF) pra ter as aulas - passava a Golden Gate direto pensando: "more onde eles tiram férias" - ainda vivendo aquela lua de mel de quando se muda de país. Nesse curso eu tinha colegas de várias localidades dos Estados Unidos, e do mundo: uma menina da França, uma da Índia, um cara da Espanha e eu. Coincidentemente eu me uni com essas duas meninas para fazer o grupo do trabalho final da matéria - que consistia em trabalhar durante todo o semestre no planejamento do projeto e entregar algo mirabolantemente perfeito, mostrando técnicas e ferramentas estudadas no curso em aplicação (sim, só eu achei que Berkeley ia ser fácil… kkkkkrying). Foi quando em uma das nossas reuniões do grupo em sala de aula, logo na fase inicial de planejamento e construção da ideia do projeto, uma das meninas largou: “vamos fazer algo relacionado com Expats” - e eu, que nunca fui uma curiosa e amante do ingles fiquei a ver navios. Não fazia ideia que Expats era um encurtamento da palavra Expatriados e muito menos o que isso significava. Posso ver navios, mas não nasci boba nem nada. Bem quietinha já fui pro Google pesquisar pra poder dar meus pitacos também. E foi aí que aprendi que
Expatriado é aquele indivíduo que sai da pátria para viver no estrangeiro.
E foi quando eu entendi que eu, logo eu,era uma Expatriada.
E como uma boa expatriada eu quero falar um pouco sobre isso. Um pouco só. Na verdade um aprendizado que eu tirei desses primeiros anos morando fora da pátria amada.
Em julho vai fazer 5 anos que moro fora do Brasil. Quando viemos de mudança para a Califórnia trouxemos algumas coisas na mala - roupas, talheres, pano de prato, veio até marinex e copos de cristal (!), erva mate, conhecimento, nossa cultura, curiosidades, expectativas….
Usamos tudo isso já no primeiro mês! Desses primeiros dias até o fim do primeiro ano foi o período que eu declarei como ‘lua de mel’. Tudo é novo, tudo é legal, tudo é lindo: Walgreens, Starbucks, TacoBell, Macys, Whole Foods, BestBuy, turistar na cidade… tudo é festa porque tudo é novidade. Depois disso a gente entra na fase do “piloto automático da sobrevivência’’: onde o importante é aprender a ser fluente no inglês, aprender a conversar como um local, tentar perder o sotaque (só pra descobrir que vai ser difícil), aprender a buscar emprego, aprender a se comportar no mundo corporativo daqui, enfim.. aprender tudo do zero* a como ter uma vida ‘normal’. E nessa onda de aprender tudo de novo eu comecei a notar que não só havia esquecido meu par de sapatilha favorito no Brasil, como também uma parte de mim havia ficado por lá. A minha personalidade, uma parte da minha autenticidade, o meu jeito, a minha forma natural de ser ficou no Brasil. Guardadinha em uma mala no bairro Azenha de Porto Alegre. E sabe porquê? Porque enquanto eu estava distraída na fase de lua de mel e atucanada tentando aprender tudo e mais um pouco na fase do piloto automático eu acabei absorvendo demais dos outros, do que eu escutava, do que eu via e eu me perdi de mim. Eu sou muito observadora e tenho muita facilidade de me agarrar e lembrar visualmente de detalhes.
Então eu aprendi muito observando.
Eu copiava muito os jeitos e a forma como os americanos com quem eu convivia se comportavam perto de mim.. Especialmente no trabalho, pois ao mesmo tempo que eu estava aprendendo a minha profissão nova, eu aprendia vocabulário novo, gírias novas, frases “erradas” novas, nova forma de me comunicar, de me comportar, de responder, como atender um telefone, como deixar uma mensagem de voz (!) sim algo muito forte aqui ainda, etc… desde o básico até o mais complexo eu aprendi copiando os outros. Eu sou o legítimo bom exemplo do ‘fake it until your make it’ (finja que sabe fazer até você saber fazer mesmo). Só que no meu caso, quando chegou a hora de dar o meu temperinho no ‘make it’ eu estava muito longe de mim mesma (e esquecida de como eu reagiria naturalmente) pra agir e aí deu o piripaque do chaves e o carreteiro ficou meio sem sal. Então nessa fase de me construir aqui, talvez devido a um excesso de insegurança, eu me agarrei na fortaleza de modelar o meu comportamento com base nos outros e assim fui formando a Andressa dos States. Super positiva - óbvio né pessoal, é muito mais fácil concordar do que argumentar quando não se tem um vocabulário tão rico e complexo - uma robozinha, meio sem opinião própria, meio sem personalidade própria, meio sem sal… O que funcionou por um tempo e foi bacana! Me abriu portas, me ajudou! Mas de uns tempos pra cá eu comecei a me sentir meio perdidinha. Meio incomodada, sabe? E depois de umas boas sessões de vinho, choro, gato, viagens, terapia e coaching de carreira eu tenho pra mim que dentre tantas loucuras, alegrias, coisas engraçadas que acontecem quando a gente muda de país eu achava que o que ia me pegar mais forte era a saudade.
E eu acertei bonito! O que me pegou em cheio foi a saudade de mim mesma. E aí eu tive que parar, refletir e voltar buscar um pouco da Andressa - mais forte, explosiva, corajosa, respondona, dona de si, confiante, mandona, bold, criativa, bem louca e engraçada que ficou na mala lá no Brasil - pra dá uns tapa na cara da Andressinha dos States, ajudar ela a colocar um cropped e reagir. E olha, só um pouquinho já surtiu um efeito bom e deu um gás! É eu sei que eu disse que iria falar um pouco, mas sabe como é: sou prolixa (em português) e tenho amor pelo uso excessivo das palavras. Desculpe! Mas, se eu menti sobre ser breve, não mentirei sobre o aprendizado de expatriada: Que não importa se a mudança foi de país, cidade, bairro, casa ou quarto: não podemos esquecer a mala que contém a nossa autoconfiança e autenticidade dentro - sem elas a gente sobreviverá (não tenha dúvidas), mas vai ser um pouco mais boring e penoso o caminho. É isso que eu queria compartilhar.
Se alguém quiser me contar um aprendizado de expat me manda um DM no Instagram, ou deixa um comentário aqui!!! Vou adorar a troca de experiências, afinal esse blog e o meu Instagram são pra isso.
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*Disclaimer: essa foi a minha experiência, portanto as ideias e visões são únicas e exclusivamente dadas com base no que eu vivi. Existe cerca de 4,2 milhões de brasileiros morando fora do Brasil - dados do Itamaraty de 2020 - e podiscrê que cada serzinho desses tem seus prós, contras e aprendizados diferentes dos meus. Então sem achar que todo mundo é assim, tá? :D
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