Quando viajamos para a Turquia buscamos cultura, história, temperos, muita comida boa e, claro, restaurantes típicos espetaculares para provar em Istambul.
Essa é a história do dia que fizemos um Brunch inesquecível, tipicamente turco, em um restaurante no bairro Bebek - perto da Rumeli Hisarı - e com vista para o Estreito de Bósforo, em Istambul.
Estávamos eu e Pedro em Istambul. Era inverno - dezembro de 2014, mas estava apenas fresquinho naquela manhã. Acordamos, ligamos o canal de clipes (era o único que entendíamos o que estava passando na TV) e lentamente fomos começando nosso dia.
Lá fora a primeira reza do dia, Fajr, já havia sido cantada nos clarinetes das mesquitas e o sol já preenchia o início da manhã.
Havíamos decidido para aquele dia um passeio em um lugar mais ‘lado B’ de Istambul. O ápice do dia era visitar a Rumelihisarı - Fortaleza de Rumélia, ou mais conhecida em inglês por Rumeli Fortress.
Essa fortaleza é situada nas margens europeias do Bósforo, no que é hoje o distrito de Sarıyer. Esse, que por muito tempo foi uma vila de pescadores, um subúrbio de Istambul, localizado 15 km ao norte de Sultanahmet (região central de Istambul) e que traz uma atmosfera Turca muito autêntica.
O lugar puro, como ele é, com energia local e pouco tocada pela varinha mágica gourmetizante da indústria do turismo. O ambiente grita Turquia a cada esquina que viramos.
Um roteiro perfeito pro casal porque temos um pouco do que cada um gosta: a Fortaleza e muitos anos de história que vão saciar o Pedro; e o charme do Bairro Sariyer e todas as possibilidades exploratórias de outros pontos ‘turísticos’ (ou seja, locais - sem turistas) e muitas opções de comida boa - o que sacia essa senhora querida que vos escreve.
Naquela época - falo de 2014 - não existia Uber, então fomos no modo combo hardcore oldschool mesmo: Google maps + coragem + sevirol para desbravar.
Depois de tomar nosso café da manhã saímos do hotel (aliás, Aristocrat Hotel - Super indico! Quarto com vista para a Mesquita Azul, cama confortável, chuveiro bom, preço amigo do nosso bolso, café da manhã bom e diferenciado e muito, mas muito bem localizado no bairro de Sultanhamet. Apenas uma quadra da Hagia Sophia e da Mesquita Azul).
Enfim, como eu ia dizendo: saímos do hotel, algumas quadras de caminhada até o transporte público. Um tram, um ônibus e 1h15 min depois chegamos na fortaleza. Para os curiosos como eu, link do maps aqui.
Um pouco de História:
Andar pela fortaleza é uma experiência muito interessante, ainda mais quando se tem um pouco do contexto histórico em mente, sem contar o visual que se tem lá de cima.
A Fortaleza de Rumélia foi construída pelo sultão Mehmed II, o Conquistador entre 1451 e 1452 no local onde o Bósforo é mais estreito - apenas 660 metros de largura.
A intenção do jovem era ter uma fortaleza para impedir a ajuda de forças ocidentais do Império Romano vindas de Veneza e Genova através do Mar Negro durante o Cerco de Constantinopla.
Sim, essa mesma: Constantinopla, aquela que muito tu ouviu falar durante o ensino médio e teve que decorar a importância dela pro vestibular. Então, deixa eu te contar que teve um carinha, o Mehmed, e esse guri queria fazer o que o pai dele não havia conseguido: conquistar Constantinopla, a capital do império Bizantino para ter mais uma cidade estrategicamente situada para chamar de sua, e assim, ter mais poder, expandir o império e tudo mais essas coisas que os conquistadores da época almejavam em suas To Do list da vida.
(E pensar que hoje o jovem só pensa em conquistar seguidores no TikTok) Mas enfim, outros tempos aqueles…
E acontece que o guri era bom e o plano funcionou.
Em 1453 os atacantes comandados pelo sultão Mehmed de 21 anos (eu fazia estágio com 21 anos e me achava um máximo) derrotaram soldados comandados pelo imperador Constantino XI. Mehmed então assumiu o controle da capital imperial, encerrando um cerco militar de 53 dias, iniciado em 6 de abril de 1453. Após conquistar a cidade, o sultão transferiu a capital do Estado otomano de Edirne para Constantinopla e estabeleceu sua corte ali e nomeou a cidade de Istambul.
Assim, não é pouca coisa esse evento gente (alo vestibular!!): A captura da cidade marcou o fim do Império Romano, um Estado datado do ano 27 a.C. e que continuou no leste 977 anos após a queda do Império Romano do Ocidente. Sabe o evento que marcou o início da idade Contemporânea? então, esse aí mesmo. Essa fortaleza viu história einh?
Tá, mas e aí, vale a pena visitar essa fortaleza?
COM CERTEZA!
Do alto da fortaleza podemos ver a ponte Fatih Sultan Mehmet Bridge - uma das pontes que liga Istanbul do Continente Europeu com o Continente Asiático. Demais né??
Vimos também a fortaleza Anadoluhisarı ("Fortaleza da Anatólia") que fica localizada no outro lado do estreito, nas margens asiáticas do Bósforo. Outra madame cheia de história: uma fortaleza otomana construída entre 1393 e 1394. Vale a pena demais o passeio pelo visual - e pela história nem se fala né!
O almoço:
Pois bem, depois de umas boas duas horas e meia de caminhada, fotos, escaladas dentro da fortaleza, ver do alto da fortaleza os barcos passando pelo Estreito de Bósforo e se deliciar com o visual decidimos que estávamos famintos e era hora de almoçar.
Naquela época não se usava muito o Instagram ou pinterest pra achar restaurantes - pelo menos nao eu-, e era Google e o olhômetro a melhor forma de encontrar bons lugares pra comer. O que, na minha opinião, é maravilhoso já que a decisão é tomada sem muitas influências externas de modismos e tudo mais que vem associado com redes sociais.
Saímos do complexo da fortaleza e seguimos andando na rua que, de um lado estava o morro da fortaleza e do outro, o Estreito de Bósforo. Uma ou duas quadras de caminhada depois, encontramos esse lugar muito bonito, florido, bem localizado e, apesar de Dezembro ser fora de temporada, o restaurante estava lotado! Deu para ver claramente que eram locais - comendo, bebendo e aproveitando o que parecia ser o melhor dia de suas vidas.
Sade Kahve é o lugar: localizado no lado da rua que costeava o morro, música boa tocando, cheiro de comida boa, um lugar tão lindo, cheio de gente interessante, enfim, uma atmosfera perfeita pra um almoço.
Ah, e a fome, que antes era pouca, começou a se tornar um monstro dentro de mim - eu mal conseguia pensar em outra coisa a não ser no kebab que eu iria comer, ou no espetinho de carne de cordeiro, talvez um pottery kebab…
Nossa, só de lembrar das opções de comida e dos temperos que fomos apresentados em Istambul já começo a salivar…e àquelas alturas do dia o meu café da manhã já havia completado sua missão no mundo e me dado energia até ali, agora era hora de comer mais comida boa! Reabastecer a alma e o ser com a melhor comida turca possível!
Ficamos na fila e logo em seguida a hostess nos colocou em uma mesa perto janela com vista para o Estreito de Bósforo e a Fatih Sultan Mehmet Bridge.
Enfim, nossa garçonete chegou. Se apresentou. Entregou o menu. Escolhemos nossas bebidas e ela disse que voltaria em seguida com os drinks e para anotar nosso pedido do almoço.
Uau. Que menu interessante, pensei.
- Eu poderia facilmente comer uns 3 a 5 pratos tamanha a minha fome impulsionada pelo buraco que existia dentro de mim àquela hora - pena que eu não entendo nada do que ta escrito nesse menu.
Eu normalmente levo tempo pra escolher quando o menu é familiar, agora imagina em uma língua bem diferente a qual eu não entendo, com pratos tradicionais que eu não conheço e em um menu clean - do tipo com poucas ou quase nenhuma fotos.
- Moça, excuse-me, preciso de uns 37 minutos pra decidir o que vou comer. Obrigada. De nada.
Enfim, depois de uns bons 10-15 minutos de análise no menu, Google tradutor e discussões de menu estávamos satisfeitos com nossas escolhas.
Perfeito. Venha moça, estamos prontos pra pedir!
Nossa garçonete chegou na mesa e eu comecei meu pedido. Engraçado era que ela não estava anotando minhas escolhas.
“Uau que guria boa, vai decorar tudo. Será que ela não se perde? Sera que ela nao vai se enganar? Moça polamordedeus nada de erros - estoy FAMINTA.” Pensava eu.
Ai um segundo pensamento veio: “será que ela tá me entendendo?” Aí pra garanti repeti tudo e apontei um por um no menu.
Pensamento numero 3: Pronto. Agora ela deve ter entendido. Só esperar o Pedro pedir, vamos bebericar mais uns golinhos e a comida finalmente chegaraááá!!!
Porém, nessa fração de segundos entre meus pensamentos o fatídico momento aconteceu. Aquele momento que muda o curso da nossa vida para sempre. Aquele momento que nos damos por conta que, quando famintos, não existe nada e ninguém mais poderoso no mundo do que uma garçonete.
A moça olhou bem fundo dos meus olhos e - com toda a calma do mundo - em seu inglês disse:
“Senhora, esse menu apenas estará disponível a partir das 5pm. Nós estamos servindo Brunch agora, as opções estão no outro lado da folha.”
Meu desespero foi tanto por que a cada palavra que saía da boca dela eu via meu almoço dos sonhos escorrendo vagarosamente por entre meus dedos e eu já não tinha poder nenhum para fazer alguma coisa.
1. Já havíamos escolhido o restaurante
2. Já estávamos sentados com o menu na mão
3. Drink estavam bebidos - até brinde foi feito
Eu estava rendida. O que me restou foi avisar a garçonete que iríamos precisar de mais um tempinho, virar a página e ver o menu do Brunch.
Fui e voltei duas vezes com os olhos de cima pra baixo de baixo pra cima e nada de achar as carnes. Massa?
cadê o Kebab????
cadê o Kebab???? MEU DEUSSSS!!!
QUE DIABOS É UM BRUNCH*????
Olhei vagarosamente por cima do meu menu pra analisar quão crítica estava a situação com o Pedro do outro lado da mesa. E para a surpresa de zero pessoas o desespero, a dúvida e a indignação estavam tão presentes na expressão dele que eu decidi não acessar o caso ainda. Vou nos dar um tempo para assimilar a informação.
Passados alguns minutos de silencio, apesar de parecer uma pequena eternidade, criei coragem para abrir a discussão e trazer o problema para a mesa. Literalmente.
“E agora, o que vamos fazer?”
Nesse meio tempo que eu estava olhando o menu do brunch e batalhando com meus demônios internos (no caso minhas lombriguinhas famintas) para decidir o que daquele menu nos faria felizes o Pedro já havia checado no Google mais algumas opções na área - toda com horário de brunch - e descoberto que é muito tradicional nessa região o Brunch de Domingo. Os jovens, locais e alguns poucos turistas vem para essa região para aproveitar o dia e iniciam a jornada com o tradicional Brunch.
Ou seja: “Andi, não tem Kebab, vai ter que ser ovos e torrada mesmo.”
A essa altura eu já havia aceitado o que o destino havia reservado para nós naquele dia. Dei mais uma olhadinha no menu do Brunch, pedimos o tradicional Turkish Breakfast - já que estamos no inferno porque não abraçar o diabo?
E queeeeee 'diabo' DELICIOSO!!!!
A vontade de um Potery Kebab ainda ficou rondando meus pensamentos por uns minutos, devo confessar. Mas logo sumiu quando comecei a provar as delicias do café da manhã de 10 peças ou mais feito de pequenos pratos salgados e doces, incluindo salada, omelete, frittata com salame, tamaras, queijos, mel, geléia, pães deliciosos e muito mais.
Curtimos cada segundo do nosso primeiro Brunch da vida. Em um restaurante em Istambul. No pé do morro onde fica a Rumeli Fortress, no Estreito de Bósforo.
Ah, adivinha o que foi a janta naquela noite? Mas isso é história pra outro dia.
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Vai que o próximo destino de viagem de vocês seja Istambul? Aí já sabe onde comer um Brunch sensacional no Domingo!
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