top of page

Chardonnay e Dry Martini

Atualizado: 7 de fev. de 2024


Sentada no canto da mesa, com uma taça de vinho Chardonnay na mão eu as observava enquanto elas conversavam.


Três ladies em seus late-50s: Chirsty, uma mulher mimada e decidida – unhas bem feitas, cabelo loiro claro, um pouco desidratado, olhos claros e ameaçadores e uma boca fina – sem batom, rodeada de algumas ruguinhas. A líder da turma, com certeza. Sempre tinha a palavra final e gargalhava com veemência após cada comentário salgado que fazia.


A sua diagonal, Jenna. Também loira, cabelos curtos que gritavam por uma hidratação. Um rosto de mulher experiente, claramente retocado pelo botox e um tanto esquecido pelo sol. Seus comentários ácidos e rápidos varriam a memória dos acontecimentos e reuniões do dia em busca da próxima vítima do grupo. Apesar de ser possível ver uma gota de maldade escondida atrás de um grande sorriso, ela parecia uma mãezona de bom coração tentando ‘catch up’ com as duas amigas.


E na frente de Jenna, à esquerda de Christy sentava-se Trish, a mais quieta do trio. Tinha uma cara um tanto mais simpática, com um sorriso mais amigável, mas ainda era possível ver por debaixo da capa de experiência bondosa que ela vestia uma certa vontade de ser a mais diabólica do grupo.

Três hienas famintas por dry martinis, camarões e uma boa peça de fofoca faziam suas gargalhadas ecoarem pelo salão do restaurante.

E eu, a mais inexperiente do grupo com minha taça de Chadornnay na mão - que eu fazia dançar de tempos em tempos, antes de tomar um gole – observava e sorria. Na minha posição de forasteira do grupo não podia opinar muito, visto que pouco sabia - ou até nem mesmo conhecia – os alvos da conversa.


Estávamos em um dos restaurantes mais tradicionais de San Francisco celebrando o final de um dia de trabalho. Na mesa, escargot fazia companhia a uns chips com um molho de espinafre, shrimp cocktail, uma garrafa de vinho branco e taças de martini.


Enquanto aguardava meu Rib Eye com mashed potatos chegar não pude deixar de notar os comentários fortes, tais como o vinho envelhecido em barril que eu tomava, e por um instante me peguei pensando:


Como seria esse cenário se eu estivesse no Brasil? Se ele fosse vivido em português. Será que seria eu uma das hienas famintas por comentários ácidos? Será que seria eu a observadora do grupo ou a líder engenhosa que escolhe as fofocas calmamente a fim de ter certeza de que nenhum alvo será esquecido?


Difícil saber.


Morar fora do Brasil e viver em outro idioma nos descaracteriza um pouco. Ao mesmo tempo que mantemos nossa personalidade é necessário construir uma vida nova.


O imigrante precisa permitir-se mergulhar em uma inédita realidade e absorver - com coração de forasteiro e olhos curiosos - o que o novo lar tem a oferecer.

E foi pensando nisso que me atrevi a provar escargot, e mais, quando o garçom apareceu de novo na mesa, decidi trocar a minha taça de Chardonnay por um clássico Dry Martini. Um pequeno passo para as minhas amigas hienas famintas - que após se entreolharem me deram uma piscada de aprovação - mas um gigantesco salto para a Andressa expatriada, que já no primeiro gole entendeu o porquê das gargalhadas tão altas.



Comments


20210304_103843_edited.jpg
About Me

Uma guria viajante aspirante à escritora, que ama fotografar, comer comida boa e compartilhar com os amigos o mundo que ela vê.

 

Read More

 

Assine a minha Travelsletter e receba conteúdo exclusivo e as histórias em primeira mão! 
 

Cheque seu email, faça suas malas e vamos explorar!

© 2024 by Andi Gomes.

bottom of page